27.4.07

Fome


Não consigo dormir. Parece que tenho fome. Há uma hora atrás, quando ainda não tinha fome, o vizinho começou a martelar depois de gritar impropérios à mulher. Se calhar agora está a partir-lhe o crânio, a desfazê-lo à martelada como se faz a uma sapateira em esplanadas de Verão regadas com vinho verde. Depois fechar-lhe-á o caixão, prego por prego, martelada por martelada.
Bato na parede com fúria ensonada, Pára lá com isso, caralho. E ele pára.
Volto-me na cama. Volto-me outra vez. Parece que tenho fome. Começo a pensar em sexo, talvez a fome seja de outro tipo, o tipo de fome de nunca ficarmos cheios demais, o tipo de fome de sempre termos espaço para uma sobremesa cremosa. Parece a fotoreportagem que vi no outro dia. Dizem que sim, que grandes planos de homens e mulheres com sémen na cara é erótico. Parece que os filmes porno acabam sempre com a gaja a levar com sémen nas trombas. Se calhar os filmes porno gay também acabam com a ejaculação na cara do outro. Curioso, nunca tinha pensado nisso dos filmes porno gay, nunca vi nenhum. De qualquer maneira não comprei a revista. Todos os outros artigos pareciam sérios demais.
Tento masturbar-me, mas não consigo. Há dias em que a imaginação é mais lenta do que os dedos e os vizinhos a foder na casa ao lado são um atentado aos sons que podemos (re)criar na nossa cabeça, aos nossos próprios sons, quando pensamos que ninguém nos ouve, quando pensamos que todos dormem.
Atiro o lençol para o lado. Faz calor. É uma noite de Abril em Berlim e faz calor. Este Inverno nem o senti, quase não tive frio, quase que não foi Inverno. Mas, bom, agora não quero pensar nas alterações climáticas. Prefiro pensar, e penso, em todos os homens da minha vida. Bom, em todos é melhor não. De maneira que tiro a mão das cuecas.
Levanto-me e vou fumar um cigarro. Por enquanto ainda posso propulsionar o sono com um cigarro, por enquanto ainda sou fumadora, como se não o fosse ser sempre, ex-fumadora, fumadora mesmo depois de deixar de fumar. Ainda posso. Levantar-me a meio da insónia e ir à cozinha fumar um cigarro no escuro. Não acendo a luz para não ver as traças que já devem ter entrado pela janela aberta. Odeio bichos.
Depois fui-me deitar outra vez. Já não me lembro se me masturbei. É que há dias em que adormeço antes.

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