4.4.07

the real life

ia no túnel da estação contra a maré de pessoas, a pensar no filme, a tentar não pensar na minha vida, a olhar para os outros e a calcular o nível ao quadrado de insignificância das suas vidinhas de merda, qual de nós levará a vida mais insignificante, dias inteiros à espera de qualquer coisa, uns do totoloto, outros do amor eterno, outros do metro, outros de uma luz. hare krishnas em procissão no outro dia na chausseestrasse, cientologistas todos os dias na wilmersdorfer, as testemunhas de jeová aos sábados nas escadas rolantes de leopold platz, os protestantes aos domingos na missa em frente de casa, quase parece que estão cá dentro e me destapam os sonhos como a fúria de deus no antigo testamento, e depois venham-me cá dizer que o tipo ficou misericordioso no novo testamento e que não há cabelo que caia da nossa cabeça sem que ele se dê conta, e levam mas é com a bíblia que eu li e que não me valeu de nada, fiquei na mesma, é um romance interessante e tal, mas essa cena dos cabelos é como a história da carochinha, porque se é assim, comigo o gajo deve andar mesmo ocupado, até aposto que, por causa de mim, já arranjou um upgrade para os programas de cálculo que usa, e enquanto faz contas dos cabelos que me caem e dos que hão-de nascer, hão-de?, trabalhinho que se veja, nada, vai-nos deixando aqui para baixo a modos como que desesperados e os outros, aqueles que dizem ter encontrado a luz, coitados, andam também eles desesperados em arranjar mais discípulos, ovelhinhas obedientes que comam relva e façam mé, porque não querem estar sozinhos, porque sabem que lutar sozinho é sempre em vão.
no filme, o grande forest whitaker dizia this is the real life. the real life. mas qual real life? preocupar-me com coisas que um dia, quando souber que tenho um cancro nos ovários, não me vão servir de nada? casa, trabalho, pilhas de livros, homens chatos, chuva, o café que se acabou, o café não se acaba, estúpida, foste tu que o bebeste todo, e depois não arranjas tempo para ir comprar mais, é como o aspirador que não funciona há um ano, mas comprar um que faz falta, era o compravas, só merda sem sentido nenhum, andar a trabalhar para alguém que de nome só lhe falta um t para ser idiota, chegar a casa com vontade de atirar as almofadas à parede, só porque tenho demasiado amor à tralha toda que fui acumulando e só me vai atrapalhar na altura de mudar de casa, que ainda nem sequer tenho, porque ainda não a posso ocupar, para que lado estão as janelas, e a varanda que não é grande o suficiente, como se isso fosse importante, como se eu tivesse dado algum uso à varanda que agora, ainda, tenho, só a porra de umas flores que sempre morrem, se não tem banheira não quero, como se eu pudesse dar uso à que agora, ainda, tenho, se a encho, rebento com os canos, não quero aquecimento a gás que é caro, como se eu não andasse a pagar o excesso do aquecimento central de 2005 em prestações, o que será o de 2006, e ainda por cima não me acordasse com os barulhos que faz, dantes às quatro da manhã, agora às cinco, foi a mudança da hora minha senhora, eu não estou a inventar nada, ou acha que acordo durante a noite porque quero, há três meses, três fucking meses que não tenho uma noite de sono inteira, um pedaço de noite, o contrário de uma noite despedaçada, partida ao meio, como uma barra de chocolate, um bocado para agora, o outro para depois, olha que depois engordas, pfff, como se agora adiantasse muito fazer dieta. e digo mais, caralhos me fodam mais esta merda toda, sim, caralhos, se possível muitos ao mesmo tempo que é para ficar bem fodida, mas não, não digo, porque depois me telefonam a perguntar o que tenho. as pessoas agora já nem me perguntam como estou sem ser quando já sabem que estou mal, ou menos bem, parece que têm medo de receber uma resposta medíocre, como a vida, vai-se andando, nada de especial, pois aguentem-se que comigo nos próximos tempos vai ser assim, vai-se andando, bem à portuguesa, não se anda nem depressa nem devagar demais, anda-se como se pode e é se não formos já coxos de nascença. pois temos pena. se já sabem não perguntem. eu agora não consigo correr para apanhar o autocarro. espero pelo outro. à chuva e tudo que é para ver se lavo a mente de tanta asneira. e o irónico disto tudo é que eu nem sequer ando de autocarro. foda-se.

1 Kommentare:

Anonymous Anonym meinte...

irra...
C.

1:28 PM  

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